Apresentação

Este blog tem como objetivo divulgar e compartilhar meu trabalho na Psicologia, publicar produções e reflexões sobre minha prática, sobre a pessoa e seus relacionamentos. O nome Ser e Crescer engloba muito de como penso e vejo o ser humano e me dirijo às pessoas com quem trabalho. Remete à beleza do ser como e quem se é, ao respeito, à acolhida e à aceitação incondicional do ser, e ao impulso intrínsico para o crescer. Estou profundamente comprometida com cada pessoa que está diante de mim e com seu crescimento, sabendo que este crescer é realmente possível.







segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O doído sentimento de vazio

       A imagem evidencia o sentimento ou sensação de vazio interior, bastante comum em nossos dias. O sentimento de vazio é acompanhado por angústia, ansiedade, podendo haver outros sentimentos, como tristeza profunda, raiva, desconforto.
      Do ponto de vista psicológico, este vazio não é principalmente um vazio de alguma situação do contexto atual, mas é como um sinal interior de necessidades que não foram atendidas no passado, e que ainda precisam ser resolvidas.
         Há muitos adultos que, por mais que sejam amados no momento, não se sentem preenchidos, ou merecedores de amor, e continuam se sentindo vazios. Ao mesmo tempo em que é experimentado o desejo profundo de estar com as pessoas, o estar com os outros não preenche, e o vazio continua. Um vazio que aponta uma falta, de muitos momentos em que precisavam receber amor, mas não o tiveram. Em geral, situações de opressão física e/ou psicológica, abuso sexual, violências diversas, negligências, estão relacionadas ao sentimento de vazio.
      Enquanto o sentimento de vazio não é encarado, trabalhado, permanece incomodando, podendo se manifestar de muitas formas: ciúmes excessivos, uso de drogas, insatisfação constante, trocas repetidas de relacionamentos afetivos, baixa auto-estima, mentiras ... Há ainda a dificuldade ou intolerância ao silêncio, o fazer muitas coisas, busca incessante de consumo de coisas, mesmo sem necessidade...
           Alice Müller, no seu livro “O drama da criança bem dotada”[1], desenvolve muito bem como os sentimentos infantis que não foram atendidos permanecem presentes na vida adulta, como que pedindo acolhimento e resolução. Trago aqui um trecho do seu livro:
          “Não podemos mudar em nada nosso passado, não podemos desfazer os males que nos foram imputados na infância. Mas podemos nos mudar, ‘consertar’, reconquistar nossa integridade perdida. Isso é possível à medida que decidimos observar mais de perto o conhecimento sobre o passado arquivado em nosso corpo, e colocá-lo mais perto de nossa consciência. Certamente, é um caminho desconfortável, mas é o único que nos oferece a possibilidade de, finalmente, deixar a invisível (e ao mesmo tempo cruel) prisão da infância, nos transformando de vítimas inconscientes do passado em pessoas responsáveis, que são cientes de sua história e, com isso, capazes de conviver com ela” (p. 15).
          Não há dúvida de que se permitir sentir a dor do vazio é difícil, bem difícil. Porém, “fazer de conta” que ele não está presente não fará com que ele saia, mas, ao contrário, o manterá por mais tempo, com maiores consequências. No caso de ter sofrido agressões físicas, por exemplo, aumentará a chance de repetir com os outros as próprias situações vividas – o que acontece especialmente na relação com os filhos.
         Ademais, sempre é tempo de olhar para si, de buscar refazer o sentido da sua história, e construir novas possibilidades de relação consigo e com os outros. Belas formas podem surgir mesmo nas mais duras realidades, assim como podem brotar plantas nos desertos mais áridos.



[1] MÜLLER, Alice. O drama da criança bem dotada: como os pais podem formar (e deformar) a vida emocional dos filhos. São Paulo: Summus, 1997.

         * Texto publicado no Jornal Cidade Leste, edição de outubro de 2013.

Nenhum comentário:

Postar um comentário